Para entender a atual instabilidade política boliviana é necessário conhecer seu matiz histórico. A Bolívia é marcada por um conflito que divide uma elite ultra conservadora de natureza colonial de um lado e indígenas camponeses do outro. O problema que por diversas vezes a elite resolveu seus problemas na base da violência e genocídio. Tudo começou com o levante de camponeses contra os proprietários de terra (1780). Após esses acontecimentos a prática de exterminar continuou a exemplo dos conflitos de 1874 e 1899, nas terras altas e as terras baixas do país, desdobraram-se em manifestações que terminaram em novos massacres como o da rebelião de Machaca (1921) ou a de Chayanta, (1928). Aconteceram massacres de operários e trabalhadores também, como o extermínio de mineiros em Uncia (1923) , Catavi, (1942), a guerra do Chaco (1932-1935), a revolução de 1946 e de 1952, a de 1964, a matança de San Juan, em 1967, o golpe militar de Bánzer, em 1971, o massacre de trabalhadores e universitários de 1979, a marcha pela vida, em 1986, a marcha pela terra , em 1990, a guerra do gás e o massacre de El Alto, em 2003, e, agora, o massacre de Pando.
Obviamente esses grupos conservadores de direita fazem tudo para desestabilizar e minar o governo do Presidente Evo Morales, um legítimo representante dessa oposição indigenista e cunhada pelo histórico de opressão, disputas por terras e morte. Diante deste sempre presente passado histórico de injustiças não faltam defensores da política do Presidente boliviano, que foi eleito democraticamente e por uma eleição legítima. Cometem até o exagero de dizer que ele é um defensor da democracia boliviana.
Pouca gente se lembra que Evo Morales aprovou uma Constituição às pressas, apresentou um texto constitucional pronto na calada da noite e sem a presença da oposição. Particularmente acho estranho um paladino da democracia apresentar um texto pronto e convocar uma Assembléia Nacional Constituinte para se realizar no dia seguinte. O texto foi aprovado em quinze horas. Para se ter uma idéia a nossa Constituição deve ter levado uns três anos de intensos debates com a sociedade.
Era lógico que ia ter troco, é claro que a elite boliviana ia querer descambar para a autonomia ou até mesmo independência das províncias mais ricas. Agora faço as seguintes indagações a vocês: as cenas de soldados do exército atirando em civis bolivianos por acaso são diferentes do que fazia a elite boliviana quando queria sufocar rebeliões? Quais são as qualidades de um líder que respeita a democracia? Será o poder de união ou o de divisão? De litigar ou negociar? Será certo incitar pobres contra ricos e vice versa? Evo Morales só demonstrou inépcia e revanchismo perante a crise, parece que seu interesse maior é manter as coisas ou como eram antes, só que agora a elite opressora de outrora é que precisa ser massacrada.
O revanchismo (comum em toda América Latina) ou como preferem alguns: vingança mesmo, não irá resolver os problemas e sim vai trazer mais caos. Vejo um conflito de proporções étnicas que não terá fim. A menos que surja um líder capaz de defender os direitos dos silvículas e solucionar suas mazelas históricas e, por outro lado, olhar para o futuro com o propósito de mostrar para elite conservadora, que não há mais lugar para segregação na Bolívia moderna.
Um comentário:
cara, eu acho o seguinte. Nós, latino-americanos, não somos democráticos, não temos a democracia em nossa idéia de nação (até porque não temos uma idéia de nação) então não dá pra esperar que esse povo que embora fique pra cá do meridiano de greenwich, não é exatamente ocidental, mas algo diferente. Estamos nos civilizando. Vale lembrar que na revolução francesa, o revanchismo comeu solto. Só penso o seguinte, se o governo está fazendo pelo povo oprimido e contra os antigos opressores, ótimo, porque a esquerda do brasil nem isso faz já que quem paga o pato no brasil é sempre a classe média. Acho que não dá pra forçar a noção de civilização e democracia nem no iraque, nem aqui e nem na bolívia mas que se revoluções reais acontecerem, mesmo que às custas de muitas vidas, elas servirão para nossos filhos e netos aprenderem em primeira pessoa sobre como nós fomos idiotas. Nós latino-americanos somos bárbaros e primitivos e temos muito o que aprender sobre nós mesmos e sobre como vivermos em sociedade, acho que isso é um processo e não tem como acelerar.
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